20090414

andrew bird.




Se tivessem faltado a Andrew Bird algumas das condições necessárias para ser um primoroso músico, daqui a uns anos ele seria, com certeza, uma personagem parecida com o mais velho habitante do bairro Christiania aka Free City, em Copenhaga, que toca violino e vive num quinto andar, rodeado por memórias e quinquilharias, e sem elevador.

No seu novo album Andrew Bird oferece-nos sons da natureza, dos portos e cidades por onde viajou, donde trouxe ritmos cadenciados e olhares, e faz-nos escutar o clamor de um que acredita ser, primeiro de tudo, animal. Os relatos poéticos e caminhos sonoros destas canções, construídas e interpretadas com agudeza e talento, revelam versos como:

“so they took me to the hospital, they put my body through a scan, what they saw there would impress them all, for inside me grows a man...”





Constantes imagens, quase fantasmagóricas, que revelam a estranheza de um homem perante o mundo em que vive, e a frieza de uma sociedade desumanizada e avessa à mudança. Andrew Bird proclama, mais uma vez, o nosso fim. Exalta a capacidade de cada um, enquanto partícula, entre tantas outras. Rejeita o ódio e a redenção perante o que é exigido
("Love or hate acts as an axis, so procreate and pay your taxes").

Os seus medos estão em cada linha e persistem na renúncia à vida moderna.
Novamente, e cada vez melhor, ele cria puzzles (i)lógicos em que as canções ganham perspectivas tão complexas que nos sentimos (agradavelmente) submersos pelos seus pensamentos engenhosos. Podemos olhar para este conjunto de liberdades criativas de Andrew Bird quase como um manifesto pela preservação da relíquia que é a vida individual. Um longo exercício sobre o desastre do nosso projecto enquanto sociedade.
Imagino que o seu desejo seja poder continuar a ouvir a natureza e os seus sons, aqueles que tão bem utiliza e recria.




Rita Cabral, Atol.

No comments: